quinta-feira, 14 de março de 2013

Um tripé manco

Há um discurso em moda pronunciado amiúde senão por todos, pelo menos pela grande maioria dos reitores das universidades e institutos federais pelo país afora: "Nunca tivemos tanto dinheiro". Quem é da comunidade acadêmica certamente já ouviu esse pronunciamento.
No entanto, essa afirmativa soa, no mínimo, contraditória diante dos grandes gargalos estruturais que ainda afligem tanto professores, servidores e alunos do consolidado Magistério Superior; como do emergente Ensino Básico, Técnico e Tecnológico.

É fato que nos últimos dez anos os investimentos do Governo Federal destinados à educação aumentaram expressivamente. Além dos dados oficiais, merece destaque o levantamento feito pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado no final de 2012, onde mostra que o Brasil foi quem mais ampliou investimentos em educação entre 2000 e 2009, em um grupo de 29 países avaliados. O estudo ainda ressalta que o país está "gradualmente se aproximando" dos integrantes do chamado G20 (grupo das nações mais ricas do mundo).

Nada mau para uma nação cuja educação foi secularmente negligenciada por suas elites. Vencer esse atraso histórico certamente não será possível da noite para o dia e tampouco obra de uma geração. Por isso mesmo, é no mínimo alentador o fato de a Câmara dos Deputados ter aprovado o Plano Nacional de Educação que prevê a aplicação, em até 10 anos, de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) na educação.

Mas então onde está a incoerência deste discurso? Atrever-me-ia a responder, sem medo de errar: na gestão destes vultosos recursos.


Formamos nas últimas décadas um número expressivo de professores- pesquisadores de qualidade, fomentados por agências estrategicamente criadas para esta finalidade; como a Capes, CNPq e Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa. Mas somos capengas quando o assunto é professor-gestor.


O problema é ainda maior quando se tem em conta que a universidade brasileira é vítima de uma lacuna de oito anos em que foi irresponsavelmente impedida de contratar professores e técnicos administrativos entre 1994 e 2002. Um hiato que tem reflexo até hoje no quadro funcional das instituições que não puderam promover uma transição harmoniosa entre aqueles profissionais mais experientes que saíram e aqueles mais jovens que entraram posteriormente. Perdeu-se, nessa janela, uma grande oportunidade de transferência de conhecimentos entre os pares, sobretudo a prática de gestão.

Mais grave ainda é a situação das centenas de novos campus de Institutos Federais criados nos últimos anos, onde em sua grande maioria o quadro docente é composto por jovens mestres e doutores que além da complexa missão do ensino, da pesquisa e da extensão, ainda são demandados para cargos de administração, sem terem o mínimo de experiência em gestão educacional que a função exige. Literalmente, atuam no sacrifício.

O fato é que entre o recurso disponibilizado e a compra do reagente para o laboratório, por exemplo, há um caminho burocrático (e necessário, diga-se de passagem) pouco afeito à grande maioria dos professores que muitas vezes são ótimos educadores, pesquisadores e extensionistas, mas péssimos gestores.


Por isso mesmo, a máxima de que a universidade se assenta em um tripé imaginário, formado pelo ensino, pesquisa e extensão, precisa incorporar urgentemente outro elemento: a gestão. Sem uma gestão de qualidade, é quase impossível se promover ensino, pesquisa e extensão em níveis superiores.


É imperioso reconhecer o grande esforço governamental diante de dois desafios estratégicos na área educacional brasileira que são a qualificação dos professores que atuam nas escolas de educação básica e a capacitação do quadro funcional atuante na gestão do Estado Brasileiro. Para isso o Ministério da Educação lançou o Plano Nacional de Formação de Professores e o Programa Nacional de Formação em Administração Pública (PNAP). Ocorre que o PNAP engloba um curso de bacharelado e três especializações: Gestão em Saúde, Gestão Pública Municipal e Gestão Pública. Não há nada específico para a área educacional.


Mais que isso, diante da nova realidade educacional brasileira, muito mais complexa e dinâmica que dez anos atrás, exige-se a adoção de uma política nacional de capacitação e estímulo à gestão universitária e escolar. É fundamental que se valorize mais essa atividade, desde uma maior pontuação do currículo acadêmico, mais e melhores gratificações e até mesmo a criação de uma agência específica voltada à formação de uma nova geração de gestores na área.


Caso contrário, mesmo com investimentos crescentes, correremos o isco de avançarmos aquém das nossas necessidades. Ou damos um grande salto adiante, ou patinaremos em cima deste tripé em meio ao déficit gritante de gestores minimamente capacitados.


Luciano Rezende Moreira é ex-presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) e professor pesquisador do Instituto Federal Fluminense.
Noticía retirada DAQUI.

Nenhum comentário: